sábado, 8 de março de 2014

Introspecção...

     Estava escrevendo uma carta, depois de muitos e muitos anos sem fazer isso. Não é uma novidade o que segue, mas me surgiu o devaneio de ir beber umas cervejas num bar com umas boas companhias. A questão que surgiu foi: quais/quem seriam essas companhias? Hoje me considero alguém sem amigos próximos. Os poucos estão distantes, ocupados...
     A solidão existe e é uma bobagem negá-la. Boas companhias? O que seria uma boa companhia nesse mar de pessoas interesseiras, invejosas e em alguns casos/circunstâncias perversas?
     Fundamental seria uma ou duas companhias que além de ser(em) boas, me fizessem bem e vice-versa. E isso aqui não é uma referência a um "homem" na condição de namorado, noivo ou esposo. Nada disso.
     Apenas alguém para estar ao lado, sem falar sobre dores, dissabores, alguém pra compartilhar e comungar da cumplicidade do silêncio. Esquecer momentaneamente as convenções que nos acorrentam e não nos permitem viver intensamente nossos gozos, nossas frustrações, êxitos e medos.
     Permanecer, mesmo que temporariamente, suspensa disso tudo é só meu desejo. Não é por tristeza, não é por frustração. É apenas cansaço.
      Devo precisar de um pouco de férias... Férias do mundo.


"...O medo é como um laço que se aperta em nós.."

     O título é uma frase de uma canção interpretada pelo Lenine. Não sei exatamente se a autoria é dele também.

      Há muitos anos atrás, quanto estava com uns, sei lá, 10 anos de idade, surgiu o questionamento sobre o medo. Não me recordo das circunstâncias ou pessoas. Não lembro desses detalhes. Mas lembro da pergunta. Os indivíduos envolvidos (provavelmente crianças) responderam ao questionamento relacionando a fauna. Medo de cães, ursos... seguindo aquela linha, respondi que tinha pavor de cobras. Mas no íntimo, aquela pergunta feita foi em meu âmago. A simples resposta sobre o medo de um animal era tão superficial que nem tive a preocupação de permanecer no debate. Saí e esqueci aquele tema.... pelo menos, ele ficou adormecido.
     Um tempo depois, numa conversa entre minha mãe e uns convidados (do mesmo modo que anteriormente, não lembro absolutamente quem eram as pessoas) surgiu essa questão: "Do que você tem medo?". 
     Se tratando de adultos, dessa vez, as respostas tiveram uma abordagem com uma característica diferenciada. Alguns falaram do medo de adoecerem, outros de perderem seus pais ou filhos. Eu lembro que a resposta da minha mãe foi sobre o medo de envelhecer. Claro que imagino que depois de tanto tempo isso tenha sofrido modificações, no entanto, naquela época eu achei estranhíssima a resposta uma vez que, quem não envelhece é porque morre cedo.
     Quando chegou minha vez de responder, disse que meu maior medo era o de olhar para trás e me arrepender de algo que não fiz.
     Hoje, o meu medo é quase o mesmo. Mudou um pouco a perspectiva. O medo é o de ter perdido ou desperdiçado meu tempo, que acaba se traduzindo, de certa forma, num arrependimento também. E, infelizmente, isso é algo que não se pode voltar atrás. Desconfio que já tenha ocorrido ou que esteja ocorrendo e não sei direito, nesse momento, como lidar com isso agora... 



     

Por uma Ética com Base Afetiva no Self e a Religião Como Máquina de Produção de Hipocrisias

Observação: O texto a seguir é de autoria de um grande amigo, Frederik dos Santos, que em sua generosidade, cedeu o texto para ser publicado no blog. Enjoy!


Se a ética não parte do afeto que você sente, então ela é baseada em um equilíbrio instável e pode desmoronar a qualquer momento.
Tomemos dois diferentes tipos de comportamentos como referência, o de um psicopata e de um indivíduo numa fase egóica. O primeiro, conhece as regras de alguma ética social e pode até viver relativamente bem em sociedade como um "ator", representando os comportamentos que o fazem ser aceitos em sociedade. Ele pode ter uma outra vida privada em que pratica as maiores atrocidades que alguém possa imaginar contra a vida e dignidade alheia. No entanto, fazer mal ao outro não o afeta. Por outro lado, existem indivíduos que vivem frequentemente numa fase egóica, em que só aquilo que o afeta lhe interessa. Inicialmente, do ponto de vista prático e superficial, seu comportamento é quase igual ao do psicopata, mas difere deste por várias razões, um ato egóico na idade adulta é muitas vezes público, nem sempre é cruel ou exagerado, e na maioria das vezes, é algo pontual na história de vida de um indivíduo. Se ele estiver vivendo de fato a idade adulta, acessos a traços comportamentais típicos da idade infantil serão disparados por fatores externos. Enquanto que a psicopatia é uma doença mental que acompanha a identidade do indivíduo. A diferença quanto ao grau de crueldade é bem relativa, mas podemos afirmar sem qualquer sombra de dúvida que não existe um ato que um indivíduo psicopata (tal como um serial killer) possa cometer em que um indivíduo considerado não-psicopata também não cometa. Tudo depende das circunstâncias e de seu autocontrole. A história nos mostra que quando um sujeito egocêntrico chega ao poder, é capaz das maiores atrocidades sem qualquer remorso. O que separa o indivíduo egocêntrico dos seus atos de crueldade é a brutalidade da lei e da força de indivíduos que o possam impedir. A fase egóica é uma fase muito presente nos primeiros anos da infância. Não é à toa que as crianças são capazes de atos cruéis com seus pares. O que separa uma criança de atos com alto nível de crueldade? A ignorância, a ingenuidade e o controle por parte dos adultos. No entanto, algumas situações sociais levam os adultos a revisitarem seu estágio infantil, tais como, o abandono, o ciúmes, a paixão, etc. Quando a falta de afeto ocorre na infância, traumas podem ocorrer e atos semelhantes ressuscitam em nós comportamentos egóicos. Nem sempre este estado nos leva a cometer crueldade, porém não espere que alguém que esteja em tal estado se coloque no lugar do outro, sendo assim, esta pessoa poderá cometer atos que não leve em conta o sentimento alheio. O tamanho de sua cegueira afetiva quanto ao outro é proporcional ao tamanho do trauma e de seu autocontrole.

Um indivíduo com boa saúde mental é capaz de ser ético, pois é afetuoso e se coloca no lugar do outro, exerce sua empatia. Bem ou mal, lidamos com aquilo que nos afeta, gerenciamos nossa vida em torno disso. Administramos nossa vida de forma que minimizemos nossa dor e sofrimento em nós e nos outros, mas o afeto no outro, antes de tudo é algo que me afeta, pois a dor do outro me incomoda. Portanto, o afeto é um ótimo candidato para se fundamentar toda a ética. Seria uma forma de proteger a nós mesmos e aos outros. Se um ato direcionado a mim não me afeta, então este não teria reprovação alguma, mas se eu direciono este mesmo ato ao outro e isto o afeta, então isso deveria me afetar também. Não seria este um fundamento viável aos atos éticos? Assim, não estaríamos presos as regras de uma moral, uma educação ética baseada nesta perspectiva seria focada em ensinarmos nossos filhos a se importarem com os outros, com os sentimentos alheios tanto quanto os sentimentos próprios e nada mais. Isso envolve estimular os jovens a refletirem sobre suas próprias ações e suas consequências. Algo que não é trivial, mas todo pai e mãe deveria enfrentar este desafio de frente e corajosamente. Ensinar a amar ao próximo como a ti mesmo (uma simetria entre o outro e o self – o eu) é tão importante quanto a autorreflexão sobre a consequência de seus próprios atos.
Ensinar através de regras produz variados e enormes problemas:
(a) Quando as regras e leis, sem carga afetiva, são impostas sem qualquer tipo de reflexão críticas sobre elas, formamos pessoas submissas e dependentes da autoridade alheia para agir. Compromete qualquer educação que estimule a autonomia, a autoestima e a autoconfiança.
(b) Quando se forma o indivíduo através de regras e leis e se estimula a reflexão de tais regras e leis, corremos o risco de formar indivíduos que discutem a sintaxe e a lei como objeto, mas se esquecem de refletir sobre seus próprios atos e suas consequências afetivas. Mesmo relativizando a sua interpretação, o juízo sobre meus atos é dado pela avaliação de uma lei que é a minha principal referência, ou seja, temos um agente externo como referência. Não confiamos em nossa própria avaliação.
A existência de regras e leis morais é um atestado de nossa incompetência em se construir uma educação ética centrada no afeto próprio com empatia, e que previna ações pontuais exageradas fruto de acesso a estados traumáticos, ou seja, que nos ensine a lidar com a dor, a frustração e as decepções. As leis deveriam ser aplicadas apenas a indivíduos com diagnóstico de psicopatias graves que inviabilizariam a vida em sociedade.
O cristianismo (e outras religiões) é uma máquina de produção de hábitos hipócritas.
É comum ver pais cristãos e outros religiosos ensinarem seus filhos a fazerem ou não fazerem certo ato porque certo mandamento (que expressa a vontade de Deus) o proíbe. Alguns acreditam que podem ensinar de forma mais amorosa ao dizer que tal coisa deixará Jesus ou Deus triste ou magoado, quando deveriam dizer que tal ato magoaria os pais, e com o tempo deveriam estimular seus filhos, desde os primeiros anos em que adquirem desenvoltura na fala, a se colocarem no lugar do outro pois assim tomariam um ato contra o outro como um ato contra si mesmos.
Assim os cristãos estimulam a se construir uma educação ética descentrada do afeto próprio com empatia com sua ética teocêntrica. Tal postura entra em choque direto com qualquer perspectiva humanista em que se estimula a autonomia e o equilíbrio interno. Sem o encorajamento a um autoconhecimento afetivo, não somos levados a buscar uma autoconsciência de nossos atos de maneira mais abrangente e plena e muito menos de suas consequências. Discursamos de uma maneira que não condiz com nossos atos porque no campo da fala, impera as regras compartilhadas e impostas por um grupo social, e segui-las é quase condição sine qua non para ser afetivamente aceito pelo grupo (mas não necessariamente pelos indivíduos). Porém, no campo das ações e falas não-refletidas ou impulsivas regem as forças que nos afetam, dos desejos e carências, muitas vezes reprimidas pelas regras imperativas e impostas. São momentos que nos expressamos para além das aparências e do controle moral. Quanto mais o cristianismo reprime e constrói regras deslocadas da base afetiva no self (ou seja, no eu), mais veremos uma distância entre intenção e gesto, ou seja, hipocrisia.

domingo, 2 de março de 2014

Quem é responsável pelos seus atos?

     Eu estava essa semana conversando com minha mãe. Ela falava sobre o poder de satanás de causar danos nas vidas das pessoas. Ela chegou a citar a explanação que o pastor fez sobre como as pessoas "autorizam" os  demônios a agirem nas vidas das outras.
     Muito bem. E eu estava ouvindo, analisando e só conseguia pensar nessa justificativa "mística" para os maus atos. Em relação às coisas boas, por elas, apenas Deus é o responsável. Outra justificativa "mística". Daí comecei a me perguntar: 'Quanto é que, de fato, as pessoas são as responsáveis por seus atos?'
     Depois de um tempo pensando e analisando todas essas falas, crenças, essas justificativas "místicas" para o bem e para o mal, não consigo mais crer na existência de alguma(s) entidade(s) que se sinta(m) responsável(is) ou tenha(m) alguma função de nos fazer bem ou mal. Teorias de predestinação, carma, reencarnação, não são mais aceitáveis para mim sob o ponto-de-vista de responderem questionamentos do porque as coisas dão certo ou errado.
     Eu compreendo e respeito o conforto que essas crenças dão às pessoas. Particularmente, penso que essas crenças às aliviam de ter que lidar com o peso das circunstâncias da vida. Não é fácil perceber e ter que lidar com os fatos de que somos sim, responsáveis  pelas circunstâncias de nossas vidas. A sensação de prazer produzida pelo poder de decisão nesse aspecto pode ser atrativa inicialmente e depois, culminar em um estresse não gerenciável. Por outro lado, lidar e aceitar o fato de que existe não apenas uma dependência, mas também uma contribuição a partir dos atos produzidos por pessoas próximas ou estranhas em nossas vidas, nos tira a possibilidade de escolha e nos deixa a mercê dos eventos alheios. Essa é outra questão real e difícil de digerir.
     Não me aborre e não me incomoda em que ou no que as pessoas escolhem acreditar. O que ainda custo a tolerar é que essas mesmas pessoas que descobriram algo que julgam ser verdadeiro, mantenham a ignóbil postura de impôr suas crenças aos outros. Não faço esforço algum, nem tive ou tenho o propósito de explanar sobre meu ateísmo com os outros. Mas gostaria que me aliviassem do porre e encheção de saco que é ouvir, não sobre como satanás agiu destruindo a vida de alguém, de como Jesus Cristo ou Deus ajudou/ajuda outrem a superar problemas pessoais ou financeiros. O que me incomoda sobremaneira é a extenuante tentativa de me convencerem que Deus existem sim, assim como o Diabo e que eu devo crer nisso, aceitar Jesus e seguir os mandamentos para ser feliz e claro, mais importante de tudo, ser salva e entrar no reino dos céus. Já o fiz e isso trouxe muita infelicidade em minha vida. Não quero mais professar isso. Não comungo dessas ideias. Por fim, peço apenas que, por gentileza, respeitem isso. E não esqueçam de desligar a luz e fechar a porta ao sair.